Mãe ou Madrasta? Qual a Questão?

26 de setembro de 2019
Mãe ou madrasta, o mito de substituição é um fenômeno enraizado na história e nos contos de fadas, onde a figura da madrasta é frequentemente retratada de forma negativa. Essa visão é muitas vezes associada a madrastas como figuras frias e egoístas, criadas para substituir a mãe biológica em famílias reconstituídas após a morte ou ausência da mãe. Esse estereótipo, amplamente perpetuado na cultura popular, contribuiu para uma imagem distorcida e preconceituosa da madrasta.

Estudos de Falche e Wagner revelam que tanto mãe ou madrasta são vistas como responsáveis pelo bem-estar da família. Elas desempenham papéis fundamentais como cuidadoras, educadoras e suporte afetivo. No entanto, a realidade contemporânea apresenta uma dinâmica familiar mais complexa. Com o aumento dos recasamentos, muitas vezes envolvendo pessoas divorciadas, a estrutura familiar tradicional se diversificou. Nessas novas configurações, a guarda compartilhada é comum, e as crianças frequentemente convivem com mãe e madrasta, ou até mesmo apenas com a madrasta, dependendo das circunstâncias.

A ideia de que a madrasta deve assumir o papel de mãe, com o mesmo nível de amor e dedicação, é um reflexo do mito do amor materno incondicional. Essa expectativa, no entanto, pode ser injusta e irrealista, colocando uma pressão indevida sobre a madrasta. A realidade é que madrastas, assim como mães, têm suas próprias características, limitações e formas de expressar afeto. É essencial reconhecer que a construção de novos vínculos de amizade e cumplicidade entre madrasta e enteados é um processo gradual e único para cada família.

No consultório, é comum observar que a aceitação da nova configuração familiar pode ser desafiadora. As mudanças inevitavelmente trazem sentimentos de insegurança, rejeição e incerteza, independentemente de se tratar de uma família biológica ou reconstituída. Esses sentimentos são naturais e podem ser vivenciados tanto por madrastas quanto por enteados. Um dos desafios mais significativos é a construção de respeito e autoridade. É possível e necessário estabelecer respeito mútuo e uma estrutura clara dentro do novo núcleo familiar.

Para que isso ocorra, é fundamental que o casal – pai biológico e madrasta – estabeleça acordos sólidos e transparentes. Esses acordos devem incluir limites claros e regras de convivência que sejam comunicados de forma aberta e honesta com as crianças ou adolescentes. O diálogo franco e contínuo é crucial para a construção de uma relação saudável e para a integração bem-sucedida da madrasta na vida dos enteados.

O relacionamento entre enteados e madrasta é influenciado por uma série de fatores, incluindo as experiências passadas da criança, o momento em que a família original se desfez e a dinâmica atual. Segundo Smith (1995) e Teyber (1995), a idade e a maturidade da criança, assim como as vivências nos relacionamentos anteriores, são aspectos importantes a serem considerados ao se desenvolver a intimidade nesse novo relacionamento. Além disso, a frequência e a qualidade do contato com a madrasta, seja em visitas ocasionais ou convivência diária, podem afetar significativamente a dinâmica familiar.

A imagem da madrasta, muitas vezes comparada a personagens de contos de fadas, pode ser marcada por preconceitos. É necessário desmistificar essa figura e entender que a madrasta é uma mulher como qualquer outra, com qualidades e defeitos, e que o relacionamento com seus enteados deve ser construído com base em respeito, paciência e compreensão mútua.

Em resumo, mãe ou madrasta, ambas têm papéis vitais e únicos nas famílias contemporâneas. Ao compreender e respeitar as individualidades de cada figura, é possível criar um ambiente familiar harmonioso e solidário, onde todos os membros se sintam valorizados e amados. A comunicação aberta e o esforço conjunto são fundamentais para superar os desafios e construir relações significativas e duradouras.

Dra. Margarete Ap. Volpi
Terapeuta Familiar e Casal

Referências Bibliográficas

  1. Carter, B., & McGoldrick, M. (2021). As Mudanças no Ciclo de Vida Familiar: Uma Estrutura para a Terapia Familiar. Artmed.

  2. Féres-Carneiro, T. (2014). Família Contemporânea e Ciclo Vital: Intervenções Terapêuticas. Editora Casa do Psicólogo.

  3. Silva, M. R., & Oliveira, A. P. (2020). Famílias Reconstituídas: Desafios e Possibilidades na Convivência com Padrastos e Madrastas. Editora Juruá.

  4. Wagner, A. (2019). Famílias Reconstituídas: Desafios e Possibilidades. Artmed.

  5. Vieira, R. T. (2021). Mães, Madrastas e Padrastos: Desafios da Convivência Familiar. Editora Vozes.